Ação rescisória e ação anulatória: conceito
A ação rescisória, no dizer de Carlos Henrique Bezerra Leite (Curso de Direito Processual do Trabalho – Ed. LTr – 4ª Ed. São Paulo – 2006, pág. 1000), é ação de conhecimento, de natureza constitutivo-negativa, porquanto visa à desconstituição, ou, também, anulação da “res judicata”. A base legal, no processo do trabalho, é artigo 836 da CLT:
Art. 836 - É vedado aos órgãos da Justiça do Trabalho conhecer de questões já decididas, excetuados os casos expressamente previstos neste Título e a ação rescisória, que será admitida na forma do disposto no Capítulo IV do Título IX da Lei n.º 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil, dispensado o depósito referido nos arts. 488, inciso II, e 494 daquele diploma legal.´
Parágrafo único. A execução da decisão proferida em ação rescisória far-se-á nos próprios autos da ação que lhe deu origem, e será instruída com o acórdão da rescisória e a respectiva certidão de trânsito em julgado. (NR). (Acrescentado pela MP nº 2.180-35, de 24-08-2001, DOU 27-08-2001 - v. Em. Constitucional nº 32.)
Decisões rescindíveis, conforme art. 485, “caput”, do CPC, são as sentenças de mérito, sentido amplo, ou seja, inclusive acórdãos.
Não são rescindíveis as decisões terminativas, ou seja, aquelas que extinguem o processo, sem julgamento do mérito, por questões processuais. Exceção feita se a extinção do processo na ação primeira baseou-se em perempção, litispendência ou coisa julgada (CPC, art. 268). Também não são rescindíveis as decisões interlocutórias, despacho de expediente, decisões proferidas em procedimento de jurisdição voluntária, sentença arbitral (cabe, aqui, somente ação anulatória – art. 33, §§ 1º a 3º, da Lei 9.307/96).
No processo do trabalho há uma particularidade: consoante artigo 831, parágrafo único, da CLT, a decisão relativa à conciliação das partes é irrecorrível (salvo quanto às contribuições sociais devidas ao INSS), de modo que o TST editou a Súmula 259 asseverando que:
“Termo de Conciliação – Ação Rescisória. Só por ação rescisória é atacável o termo de conciliação previsto no parágrafo único do art. 831 da Consolidação das Leis do Trabalho.”
Assim, só por ação rescisória é atacável o Termo de Conciliação.
Conforme Súmula 514 do STF, não é necessário que tenha exaurido todos os recursos cabíveis no processo originário. A Súmula 397 do TST dispõe ser incabível ação rescisória contra sentença normativa, “porque em dissídio coletivo somente se consubstancia coisa julgada formal”.
Ação rescisória tem por escopo desconstituir ou anular uma sentença de mérito transitada em julgado, por existência de vícios em seu bojo. Trata-se de ação, não de recurso. Objetiva corrigir sentença ou acórdão que atentem contra a ordem jurídica, garantindo certeza na prestação jurisdicional.
“A ação rescisória tem natureza declaratória e constitutiva. Declaratória porque vai declarar a existência ou inexistência de dada relação jurídica ou a autenticidade ou falsidade de determinado documento obtido, que foi objeto de exame na antiga decisão. Constitutiva porque vai criar, extinguir ou modificar dada relação jurídica a partir do momento em que for proferida a decisão na rescisória. São, assim, proclamadas as nulidades que podem ser sanadas mediante o novo julgamento.”
Sentença passível de ação rescisória é a de mérito nula ou anulável; sentença inexistente nem chega a existir no mundo jurídico, tal que não necessita de corte rescisório. Ex.: sentença proferida por pessoa não investida legalmente no cargo de juiz; sentença inexistente, à evidência, não cabendo, pois, ação rescisória.
A diferença entre ação rescisória e ação anulatória é substancial e é, decorrente, inclusive, da própria lei:
Art. 485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
II - proferida por juiz impedido ou absolutamente incompetente;
III - resultar de dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida, ou de colisão entre as partes, a fim de fraudar a lei;
IV - ofender a coisa julgada;
V - violar literal disposição de lei;
Vl - se fundar em prova, cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou seja provada na própria ação rescisória;
Vll - depois da sentença, o autor obtiver documento novo, cuja existência ignorava , ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de Ihe assegurar pronunciamento favorável;
VIII - houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que se baseou a sentença; IX - fundada em erro de fato, resultante de atos ou de documentos da causa;
§ 1o Há erro, quando a sentença admitir um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido.
§ 2o É indispensável, num como noutro caso, que não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre o fato.
Diferentemente, a ação anulatória é cabível para declarar e desconstituir tanto o ato praticado em juízo pelas partes, eivado de vício de nulidade (absoluta ou relativa), por não se ter observado regras dispostas no direito material, como o ato jurídico em geral, desde que não seja sentença de mérito transitada em julgado (passiva, neste caso, de decretação de nulidade via ação rescisória) ser decretado nulo via ação declaratória de nulidade. É o que dispõe o artigo 486 do CPC:
Art. 486. Os atos judiciais, que não dependem de sentença, ou em que esta for meramente homologatória, podem ser rescindidos, como os atos jurídicos em geral, nos termos da lei civil.
Destaque-se que a sentença da ação anulatória julgada procedente tem efeito constitutivo negativo (ou desconstitutivo), retroagindo e anulando efeitos anteriores provocados pelo ato desconstituído, ou seja, efeito “ex tunc”.
Ação anulatória na Justiça do trabalho
Exemplos de casos de nulidade de ato jurídico em geral, conforme artigo 486 do CPC:
- desconstituição da justa causa ilegalmente atribuída ao empregado pelo seu empregador. Neste caso, o ato (despedida com justa causa) de direito material é nulo e pleiteia-se, em juízo, a declaração desta nulidade e o retorno das partes ao “statu quo ante”, o estado anterior e a aplicação da conversão da demissão com justa causa em demissão sem justa causa, com pagamento dos haveres trabalhistas que o então reclamante teria direito. Trata-se de ação declaratória combinada com condenatória.
- empregado estável é (ilegalmente) demitido. De tal sorte que o ajuizamento de ação de reintegração do estável demitido ilegalmente é demanda em que se pleiteia decretação da nulidade do ato (demissão) e a reconstituição das partes ao “statu quo ante”, qual seja, retorno do empregado aos quadros da empresa e cancelamento da dispensa ilegalmente realizada.
Diferenças entre ação anulatória e ação rescisória
A ação anulatória, conforme artigo 486 do CPC:
Ajuizamento: em primeira instância —de forma incidental ou autônoma;
Objetivo: contra sentença meramente homologatória, atos praticados em um processo, nulos nos termos do direito material, e atos jurídicos em geral;
Efeitos: atingem somente o ato impugnado, anulando os atos subsequentes, não atingindo, ao menos diretamente, a sentença, mas sim ato eivado de nulidade anterior à prolação da sentença;
Prazo prescricional: para ajuizamento da ação anulatória é aquele concernente ao direito invocado, isto é, ao direito sub judice, dependendo, assim, do caso em questão.
Ajuizamento: em segunda Instância;
Objetivo: contra sentença de mérito eivada das nulidades previstas na lei processual (incisos do art. 485) e seguindo-se procedimento especial também previsto minuciosamente em lei processual;
Procedimento: especial, previsto nos artigos 485 e seguintes do CPC.
Efeitos: atinge diretamente a sentença atacada, rescindindo-a por completo, tornando-a nula, aniquilando seus efeitos enquanto decisão judicial, mesmo transitada em julgado, e não necessitando de qualquer ato nulo no âmbito do direito material;
Prazo prescricional: somente pode ser ajuizada até dois anos após o trânsito em julgado da sentença de mérito, no que difere, portanto, da ação anulatória, que não tem prazo prescricional determinado.
Conclusão: Sim, existe diferença substancial entre ação anulatória e ação rescisória; a primeira, regida pelo artigo 486 do CPC, objetiva atacar sentença meramente homologatória, atos praticados em processo, nulos nos termos do direito material, bem como atos jurídicos em geral; a segunda, regida pelo artigo 485 do mesmo “Codex”, visa à desconstituição de sentença de mérito (sentença ou acórdão).
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