segunda-feira, 11 de abril de 2011

Procurador apresenta vídeo para propor ação

O procurador Ramiro Rockenbach protocolou um vídeo de 23 minutos como Ação Civil Pública na Justiça Federal de Mato Grosso do Sul, segundo reportagem daFolha de S.Paulo. O DVD registra os resultados de uma investigação que apurou supostos desvios e má gestão de recursos federais em projeto destinado a pequenos agricultores de Rochedo, a 97 quilômetros de Campo Grande.

“Mais que documentos e laudos, queríamos que as pessoas tivessem voz”, disse o procurador ao jornal sobre o “processo-filme”, explicando que sua intenção foi apresentar “a dura realidade vivida pelos trabalhadores rurais no local”. As imagens mostram agricultores prejudicados pelo suposto desvio e relatam deficiências do projeto. Rockenbach também apresentou uma petição em papel, por receio de que o juiz não aceitasse o material, já que trata-se de uma situação inédita.

De acordo com a ação, o projeto foi lançado em 2001 para criar alternativas de renda para sitiantes ligados à Associação dos Micro Agricultores e Piscicultores de Mato Grosso do Sul (Amap). Cerca de R$ 500 mil em recursos federais foram liberados para financiar a construção de galpões, redes de energia, açudes e poços artesianos, segundo a Procuradoria. A implantação foi feita pelo governo do estado, por meio da Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural (Agraer).

Durante as investigações, a Agraer afirmou que o projeto havia sido "plenamente executado". Porém, a Procuradoria diz que "as imagens contradizem as palavras", pois os poços não funcionam, o açude não existe e as casas têm rachaduras. De acordo com a ação, presidentes de associações se apropriaram de valores. AFolha afirmou que a Justiça já determinou a citação dos acusados.

Em nota, a Agraer respondeu que o projeto foi conduzido por outro órgão, extinto há cinco anos, e a gestão dos trabalhos ficou com a Amap. Especialistas ouvidos pela reportagem da Folha disseram que os trechos do vídeo que representem provas devem ser declarados como válidos, pois a Justiça considera os meios audiovisuais como documentos para fins de comprovação de alegações. A questão da legalidade da utilização do vídeo surge quando ele substitui os fundamentos e pedidos escritos.

Legalidade do vídeo

Na opinião do chefe do departamento de Direito Processual da USP, Flávio Yarshell, o material "não é propriamente inválido porque pode atingir os objetivos de documentar o ato, proporcionar o exercício da defesa e permitir ao juiz o conhecimento do conteúdo das alegações".

Porém, o presidente da comissão da Sociedade Digital da OAB-SP, Augusto Marcacini, afirmou que o uso do vídeo é ilegal, "pois as manifestações à Justiça devem ser compatíveis com os padrões de todos. É uma pirotecnia dispensável que pode comprometer o direito de defesa".

Em artigo escrito para a Folha, o professor de Direito Constitucional da FGV Direito-Rio Joaquim Falcão afirma que cabe ao juiz decidir se aceitará ou não o vídeo. “Haverá sempre juristas a favor do documento assinado. Mas hoje audiências já podem ser feitas por teleconferência. A Justiça pode ver mais. Mas como conciliar documento e documentário quando eles se opõem? Ao juiz para decidir”.

Para ele, o procurador, ao apresentar o DVD com as imagens sobre os agricultores, trouxe “a realidade para dentro do gabinete do juiz”. “Já que o juiz, na maioria das vezes, não pode sair do gabinete, ir às ruas, falar com todos os envolvidos, não pode viajar para ver a realidade dos fatos, por falta de tempo e, às vezes, de condição, ele [Rockenbach] fez o inverso".

  • Acesse a notícia pelo próprio sítio do MPF de Mato Grosso do Sul na internet clicando aqui.
  • Assista a trecho do vídeo da petição inicial clicando aqui.


Comentário do Hierarquia Dinâmica


S E N S A C I O N A L ! ! ! A notícia só vem a comprovar que a comunidade jurídica brasileira é, SIM, muito rica e jamais será uma viúva de Clóvis Beviláquas, Pontes de Mirandas, Machados de Assis e Vicentes Ráos, como frequentemente  e injustamente se apregoa.

As teses de Pontes de Miranda, não é demais repetir, foram vanguardistas por demais na época em que apresentadas; o modelo de Código Civil de 1916 apresentado por Beviláqua, não se ignora, foi alvo de constantes retalhos por incompatibilidade do arrojo de suas teorias com o consenso da doutrina dominante daquela época.

Essa petição inicial de uma ação civil pública, proposta sob a forma de um vídeo, representa atualidade com a tecnologia disponível em sociedade; permite que o magistrado possa ser subsidiado de maiores e melhores meios de informação para que exerça com mais propriedade o seu livre convencimento; dá voz às partes e testemunhas, muito antes de seus respectivos depoimentos.

Obviamente que há limitações técnicas processuais à ampla e imediata guarida dessa modalidade de peticionamento no Poder Judiciário nacional, mas é inegável que essa foi a pedra de toque para novas discussões, para diversas outras provocações, todas com o nobre objetivo de facilitar não apenas o acesso à Justiça, mas, principalmente, a uma célere e efetiva prestação da tutela jurisdicional, exatamente como apregoa a Constituição, em seu art. 5º, XXXV e LXXVIII).

É ou não é um belo exemplo de materialização das teorias de implementação de instrumentos que permitam o acesso aos direitos materiais previstos em lei, de socialização do processo, tal como preconizado por Mauro Cappelletti na sua proposta de uma terceira onda de acesso à Justiça? É ou não é uma reverberação muito feliz da teoria da sociedade aberta dos intérpretes da Constituição de Peter Häberle?

Sintam a atualidade da iniciativa e o potencial de evolução do Direito que ela traz como carga dogmática 
implícita!

Assim como nos sentimos orgulhosos pela criação do CDC, da Lei de Improbidade e das muitas teorias de Direito Material e Processual, essa 'criação' do Procurador nos renova nesse sentimento de liderança, de iniciativa, de empreendimento intelectual, fruto, diga-se de passagem, de um servidor público que, é de cultura difundida, vive sob o manto do estigma da ineficiência e inoperância no Brasil.

O Direito brasileiro é vivo sim! Teçamos loas e rendamos encômios à atualíssima e cerebrina iniciativa do Procurador da República em Mato Grosso do Sul, Dr. Ramiro Rockenbach!

Quando eu crescer, quero ser assim.

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