“CONTRATO DE EMPREGO. PRESSUPOSTOS.
A CLT E A SUA SEMÂNTICA. INTERPRETAÇÃO. CONCEITUALISMO E REALISMO. DEPENDÊNCIA E
SUBORDINAÇÃO. O QUE TÊM DE COMUM INDEFINIDAMENTE E ALÉM TEMPO. PROCESSO
PANÓPTICO DE HETERODIREÇÃO E DE CONTROLE DO TRABALHADOR NA SOCIEDADE
PÓS-MODERNA. IDENTIFICAÇÃO DO TIPO CONTRATUAL JUSTRABALHISTA. SÍMBOLO E RELAÇÃO
SIMBOLIZADA. Quanto mais se estuda e se pesquisa; quanto mais, em sua profunda
raiz social, se volve e se revolve a terra e a essência da CLT, tanto mais
fértil e atual ela se revela, em permanente mutação, fruto que foi da sabedoria
dos seus autores (Professores Rego Monteiro, Oscar Saraiva, Dorval Lacerda,
Segadas Viana e Arnaldo Sussekind), que a conceberam e a consolidaram para além
do seu tempo, com os olhos postos no futuro, imprimindo-lhe, em determinados
temas centrais, o sopro da modernidade a perder de vista, bem distante da época
em que viviam, desprendidos que foram do conceitualismo, em prol do realismo
social. Talvez e novamente com muita sabedoria, eles tenham antevisto que,
com o passar dos anos e das décadas, persistiria a mesma dificuldade em torno de
uma legislação social, destinada à proteção dos trabalhadores, em geral,
humildes e iletrados, sem a necessária força política para embates legislativos
em face do poder e da força econômica das empresas que, por disposição da lei,
caput do art. 2o., constituem as empregadoras, isto é, as pessoas físicas ou
jurídicas que integram o prestador de serviços em benefício da consecução de
seus objetivos de produzir bens e serviços para o mercado, cada vez mais
globalizado e competitivo do que nunca. Bom exemplo da modernidade legislativa
de 1942/43, vindo das mãos de eminentes juristas, que, contrariando o pessimismo
de Drummond, segundo o qual "os lírios não brotam das leis" (poema, Nosso
Tempo), transformaram a realidade das relações trabalhistas em lírios,
encontra-se no art. 3o. da CLT, que enverga os pressupostos da relação de
emprego, aos quais devem se somar os requisitos de validade do respectivo
contrato, obtidos pela via subsidiária do art. 104 do Código Civil capacidade,
objeto lícito e forma, esta exigível apenas quando expressamente prevista em
lei. No que tange à subordinação, o legislador, sem conceituá-la, a
denominou, com sucesso perene, de dependência, também sem qualificá-la, o que
permite a sua constante adaptação e transformação à realidade pelos
intérpretes. A discussão em torno da natureza da dependência perde-se no
tempo, vem do século passado e várias foram as suas acepções científicas, tendo
em vista a influência histórico-doutrinária e jurisprudencial de cada país
França, Alemanha, Itália e Espanha, principalmente. No Brasil, o legislador não
qualificou a dependência não disse se ela seria técnica, econômica ou social.
Fez bem. Aqui, a discussão não se revelou muito acirrada, porque, com o fluir do
tempo, a dependência foi relacionada, isto é, foi identificada com a
subordinação, que passou a ser jurídica: nasce e é inerente ao conceito de
empresa e se instrumentaliza com o contrato, nas próprias veias da relação
jurídica, pelas quais flui o comando integrativo e estrutural do trabalho
alheio, heterodirigido nos limites da lei. Ocorre que esta acomodação
científica relativamente tranquila se deveu essencialmente ao sistema fordista
da produção, hegemônico durante cerca de cinquenta anos. Com a passagem da
sociedade industrial para a sociedade informacional, baseada na internet de
banda larga, no sistema hight tech de produção e de consumo em massa, sem
precedentes na história humana, alteraram-se os paradigmas, agora próprios da
pós-modernidade, em que as pessoas, a produção, os bens e serviços são muito
diferentes se comparados com as décadas passadas. As empresas enxugaram
custos e trabalhadores, reduziram os seus espaços físicos, terceirizaram e
externalizaram grande parte e fases da produção. Assim, um novo modelo
surgiu: no passado, a luz artificial mudou os ponteiros dos relógios das
fábricas, impondo ao trabalhador novos usos e costumes; no presente, a
internet eliminou o relógio de corda ou digital, assim como o relógio
biológico, impondo intensos ritmos de trabalho, de forma atemporal, embora
os prestadores de serviços, aparentemente, sejam mais livres, sejam
aparentemente autônomos. Fernanda Nigri Faria, baseada em Foucault, sustenta
que "na era contemporânea o sistema panóptico foi adaptado e continua sendo
plenamente utilizado para controlar os atos mínimos, com as mesmas finalidades
de disciplina, individualização, manutenção da ordem, maior produtividade,
eliminação de tempos inúteis e constante sensação de vigilância, apenas com nova
estrutura, com novos métodos". Por conseguinte, a subordinação continua
sendo a sujeição, a dependência, de alguém que se encontra frente a outrem, só
que por outros métodos, não tão intensos e visíveis, porque não mais tanto sobre
a pessoa, porém sobre o resultado do trabalho. Estar sob dependência ou estar
sob subordinação, é dizer que o prestador de serviços se encontra sob as ordens,
que podem ser explícitas ou implícitas, rígidas ou maleáveis, constantes ou
esporádicas, em ato ou em potência. Na sociedade pós-moderna, vale dizer na
sociedade info-info (Chiarelli), a subordinação passou para a esfera objetiva,
objetivada e derramada sobre a atividade econômica da empresa, alterando-se o
eixo de imputação jurídica: do trabalhador para a empresa. Subordinação objetiva
(Romita), estrutural (Godinho), ou integrativa (Lorena Porto), diluída e fluida
no lugar da subordinação corpo a corpo ou boca a ouvido. Nessa perspectiva
prospectiva, a dependência-subordinação aproxima-se muito da não eventualidade e
da sujeição econômica, por duas razões básicas: a) inserção/integração objetiva
do trabalhador no eixo, na estrutura, na dinâmica da atividade econômica; b)
dependência econômica, que, embora não seja uma característica uniforme,
alcança, cada vez mais, maior número de trabalhadores, pelo que pode ser, pelo
menos, um forte sintoma do tipo jurídico. Em casos limites, quando as
fronteiras são zigue-zagueantes (Catharino), a subordinação vem deixando mais e
mais de configurar-se pela ação. Restos de um modelo que se despedaçou, cujos
gomos e fragmentos se repartem e se modificam, mas que são encontrados no
determinismo atual do art. 3o.. da CLT, considerando-se a aglutinação produtiva
das diversas células da atividade econômica. Nesse contexto sócio-econômico,
tempos de busca, de inclusão e de justiça social, uma nova faceta da
subordinação se descortina: sub(sob)ord(ordem)inação(sem ação), tendo em vista
não mais os comandos e as fórmulas clássicas, porém a integração objetiva do
trabalhador na estrutura, no eixo, na dinâmica da atividade empresarial. (TRT
3ª Reg. – 4ª T. – RO 00393-2007-016-03-00-5 – Rel. Des. Luiz Otávio Linhares
Renault – DJMG 31/05/2008, p. 11)”.
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