A definição de terceirização é aparentemente simples: em vez de contratar diretamente empregados para exercer determinadas funções e desempenhar determinadas tarefas, uma empresa contrata outra como fornecedora. O “produto”, no caso, são trabalhadores. Por trás dela, porém, há uma complexa rede que envolve desde a modernização da gestão empresarial até o enfraquecimento da representação sindical, argumentos apresentados pelos que defendem ou condenam a prática.
Os motivos que levam a empresa a trocar de papel – de empregadora para tomadora de serviços – são vários. Os principais listados pelo setor empresarial são a redução de custos, a transformação de custos fixos em custos variáveis, a simplificação de processos produtivos e administrativos. Do lado oposto, os que contestam a prática afirmam que a terceirização precariza as condições de trabalho e fragiliza os trabalhadores enquanto categoria profissional, deixando-os desprotegidos e desmobilizados.
Legislação escassa
Os primeiros casos de terceirização surgiram na indústria bélica dos Estados Unidos na época da Segunda Guerra Mundial. Devido à necessidade de concentração em sua atividade-fim, as fábricas de armamentos delegaram as atividades de suporte a empresas prestadoras de serviço.
No Brasil, esse tipo de procedimento começou pela indústria automobilística, nos anos 70, e ganhou força a partir das décadas de 80 e 90 do século XX, quando a globalização forçou a abertura da economia e acirrou a necessidade de aumentar a competitividade dos produtos nacionais nos mercados interno e externo.
Na época da sistematização das leis trabalhistas no Brasil, na década de 40, portanto, a terceirização ainda não era um “fenômeno”, e, por isso, não mereceu destaque. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) faz menção apenas a duas formas de subcontratação de mão de obra na construção civil – a empreitada e a subempreitada (artigo 455) e a pequena empreitada (artigo 652, inciso III, alínea “a”).
A primeira regulamentação da matéria só ocorreria em 1974, com a edição da Lei nº 6.019/1974, que dispõe sobre o trabalho temporário em empresas urbanas. Nove anos depois, a Lei nº 7.102/1983, posteriormente alterada pela Lei nº 8.863/1994, regulamentaria a contratação de serviços de segurança bancária e vigilância.
Outras modalidades de contratação que podem ser enquadradas no conceito de terceirização são tratadas na Lei nº 11.788/2008 (estagiários), Lei nº 8.630/1993, ou Lei dos Portos (portuários avulsos), Lei nº 5.889/1973(trabalhadores rurais) e Lei nº 8.897/1995 (concessão de serviços públicos).
Atualmente, pelo menos três projetos de lei em tramitação na Câmara dos Deputados se propõem a regulamentar as relações de trabalho no ramo de prestação de serviços a terceiros: o PL 4302/1998, de autoria do Poder Executivo; oPL 43330/2004, do deputado Sandro Mabel (PL/GO); e o PL 1621/2007, do deputado Vicentinho (PT/SP).
Jurisprudência
Na prática, os litígios decorrentes das situações de terceirização, bem como as definições sobre sua licitude ou ilicitude, estão normatizados na Súmula nº 331 do TST. Editada em 1993, a Súmula 331 já passou por duas revisões, em setembro de 2000 e em maio de 2011 – a última delas para adequá-la ao entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a responsabilidade da administração pública nos casos de inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte do empregador.
A súmula considera como lícita a subcontratação de serviços em quatro grandes grupos: o trabalho temporário, as atividades de vigilância e de conservação e limpeza e os “serviços especializados ligados à atividade meio do tomador”. Os três primeiros são regidos por legislação própria. O último, entretanto, é objeto de constantes controvérsias – e um dos objetivos da audiência pública é trazer subsídios que ajudem a superar a dificuldade de distinguir o que é atividade-meio e o que é atividade-fim, diante da complexidade e da multiplicidade de tarefas realizadas em determinados setores e da legislação que as rege. É o caso, principalmente, dos setores de telecomunicações e energia elétrica. Nos dois casos, o ponto nevrálgico se encontra na legislação específica.
A Lei Geral das Telecomunicações (Lei nº 9.472/1997) prevê, em seu artigo 94, inciso II, a possibilidade de “contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço”. As empresas fundamentam-se neste dispositivo para justificar a terceirização de serviços que, sob a ótica da jurisprudência predominante, poderiam ser enquadrados como atividade-fim.
Também no caso das concessionárias de energia elétrica, a Lei nº 8.897/1995 admite a contratação com terceiros nos mesmos termos. E, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), mais da metade da força de trabalho do setor elétrico (que emprega 227,8 mil trabalhadores) é terceirizada.
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