O Ministério Público é vocacionado, pelo artigo 127 da Constituição da República, a defender a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis.
Contudo, para que aflore a legitimidade do MPT é necessário que o fato denunciado importe em lesão a direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos dos trabalhadores, pois somente na defesa desses direitos pode o Parquet atuar, inclusive mediante o ajuizamento de ações civis públicas ou coletivas (art. 129, inciso III, da CF/88).
Nesse passo, é importante destacar que os direitos individuais homogêneos se caracterizam, sobretudo, pela existência de uma questão coletiva, que confere homogeneidade àquela categoria de pessoas, à par da presença, ou não, de questões individuais, particulares ou patrimoniais.
E mais, para que se vislumbre utilidade na tutela coletiva deve-se aquilatar, diante das peculiaridades envolvidas, a vantagem do tratamento molecular do conflito em contrapartida à fragmentação da tutela.
É a tese desenvolvida, no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, dos DIREITOS INDIVIDUAIS HETEROGÊNEOS, ou seja, direitos individuais puros, conforme acórdão abaixo:
"RECURSO DE REVISTA. SINDICATO. DIREITOS INDIVIDUAIS HETEROGÊNEOS. PROMOÇÕES. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. ILEGITIMIDADE ATIVA DO SINDICATO. Predomina nesta Corte o entendimento de que - a partir da nova orientação jurisprudencial, superveniente ao cancelamento da Súmula 310 do TST, na esteira da jurisprudência consolidada no STF - a substituição processual não se acha mais restrita às hipóteses contempladas na CLT, abrangendo doravante interesses individuais homogêneos, interesses difusos e os coletivos em sentido estrito. Por conseguinte, ficam fora do âmbito de aplicação do art. 8.º, III, da CF, os chamados DIREITOS INDIVIDUAIS HETEROGÊNEOS, que não têm origem comum e dependem da análise concreta de específica e particular relação jurídica, como no caso das promoções pleiteadas na exordial (...)" (TST - 4ª Turma - RR 116100-91.2004.5.04.0024 - Relatora Ministra Maria de Assis Calsing - DEJT 27/08/2010 - destaques acrescidos).
Assim, o que desafia a atuação do Ministério Publico do Trabalho é a existência de conveniência social e a presença de interesse coletivo lato sensu.
Vale a pena a leitura do Precedente nº 17 do Conselho Superior do Ministério Público do Trabalho:
VIOLAÇÃO DE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS – ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO – DISCRICIONARIEDADE DO PROCURADOR OFICIANTE.
Mantém-se, por despacho, o arquivamento da Representação quando a repercussão social da lesão não for significativamente suficiente para caracterizar uma conduta com consequencias que reclamem a atuação do Ministério Público do Trabalho em defesa de direitos individuais homogêneos. A atuação do Ministério Público deve ser orientada pela “conveniência social”. Ressalvados os casos de defesa judicial dos direitos e interesses de incapazes e população indígena.
Atente-se que, nos casos que envolvem direitos de INCAPAZES e POPULAÇÃO INDÍGENA, não há, no meu modo de ver (e do CSMPT também) margem de discricionariedade para o Procurador do Trabalho decidir se atuará ou não, sendo obrigatória a intervenção nos feitos como custos legis, ainda que se trate de um só incapaz ou de um só indígena, sem a presença da dimensão coletiva.
Assim, na lição do ex-Procurador Regional do Trabalho e atual Desembargador Federal do Trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, Dr. Carlos Henrique Bezerra Leite (in Ministério Público do Trabalho: doutrina, jurisprudência e prática; 4.ed.; São Paulo: LTr, 2010, p. 118), a elaboração de parecer circunstanciado do Ministério Público do Trabalho será obrigatória nos dissídios individuais em que figurem, como partes ou interessados, crianças, adolescentes, incapazes e índios; nas ações civis públicas, quando não ajuizadas pelo próprio Ministério Público (Lei n. 7.347/85, art. 5º, § 1º); nos mandados de segurança (Lei n. 1.533/51, art. 10); nos dissídios coletivos, em caso de greve que possa acarretar lesão ao interesse público; nas ações de competência originária dos Tribunais, quando houver previsão regimental expressa; nos pedidos de sequestro formulados em procedimentos relativos a precatórios (CPC, art. 731); quando houver solicitação expressa do juiz ou Relator e o órgão do Parquet entender relevante a sua intervenção.
Por último, apenas alerto para os "riscos" de se defender a atuação do Ministério Público do Trabalho "de qualquer jeito". E, por outro lado, tomar cuidado com essa tese do TST a respeito dos DIREITOS INDIVIDUAIS HETEROGÊNEOS, pois já vi Juízes e Desembargadores Federais do Trabalho indeferirem pleitos em ações civis públicas sobre trabalho infantil com base nesta teoria. Por exemplo: inexistência de dano moral e não reconhecimento de despedida indireta a criança com 7 anos de idade que distribuía jornais e panfletos para uma empresa nas ruas, durante o dia todo.
Marcos G. Cutrim é membro do Grupo Partilhando (este material foi obtido através de conteúdo de e-mail do autor, durante discussão sobre os direitos individuais homogêneos e a legitimação do MPT).
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