(extraído de artigo do Prof. Marcel Vitor de M. e Guerra)
"Segundo disposição constante no art. 95 do CDC, “em caso de procedência do pedido, a condenação será genérica, fixando a responsabilidade do réu pelos danos causados”. Isso quer dizer que a condenação sempre será genérica, não havendo qualquer possibilidade, diante da lei posta, de os legitimados obterem sentença que contenha condenação cujo quantum já esteja definido.
Pela sistemática atual, o decreto condenatório proferido em ação coletiva destinada à tutela dos interesses individuais homogêneos deverá ser sempre genérico, ou seja, ilíquido. Isso não significa que seja impossível qualquer outra forma de tutela, como preventiva, inibitória, consubstanciando obrigações de fazer e não fazer ou entrega de coisa. Significa apenas que o legislador presumiu uma impossibilidade de o magistrado quantificar o valor indenizatório para cada indivíduo. Daí a necessidade de as vítimas ou seus sucessores providenciarem a liquidação de forma individual.
No entanto, o legislador previu uma segunda hipótese de liquidação, de caráter subsidiário, uma liquidação coletiva promovida por qualquer dos legitimados do art. 82 do CDC, que tem em mira a obtenção de um quantum que irá, nos termos do parágrafo único do art. 100, integrar o Fundo criado pela Lei da Ação Civil Pública.
Para nós, essa condenação fluida tutela o direito individual homogêneo, já que não houve um número razoável de liquidações individuais, situação esta que também tutelaria o direito coletivo, individual homogêneo. Como dito anteriormente, trata-se de uma ficção jurídica em que se presume tutelado o direito coletivo quando um número razoável de liquidações individuais tiverem existido. Caso contrário, ante a indisponibilidade dos direitos coletivos, nasce a necessidade da condenação subsidiária, técnica alternativa apta a tutelar o direito coletivo.
Essa fungibilidade de formas de tutela só ocorre porque se trata da tutela indenizatória para direitos individuais homogêneos. Como a carga de coletividade dos individuais homogêneos não é suficiente a ensejar uma condenação indenizatória autônoma, como nos demais direitos coletivos, a condenação torna-se subsidiária, só ocorrendo na eventualidade de não se alcançar um número razoável de liquidantes individuais, hipótese em que se consideraria tutelado o direito coletivo(individual homogêneo).
Esse tratamento flexível só é possível porque a tutela pelo equivalente pecuniário para os direitos coletivos tem um perfil diferenciado. Na verdade, não há efetiva tutela de um direito coletivo pela técnica da equivalência pecuniária.
Isso mesmo, não há como se aferir o valor financeiro de um direito coletivo. Não há como quantificar monetariamente um direito coletivo. O que ocorre quando da necessidade de o magistrado encontrar um valor financeiro para a tutela do direito individual homogêneo é a estimação do quantum pelo número de titulares individuais, mas o propósito dessa condenação não será os indivíduos diretamente, esse propósito é da tutela individual, que lembre-se, pode ser disponível, o propósito será outro, será punir, educar o causador do dano, assim tutelando de forma reflexa o direito coletivo.
É por isso que o legislador entendeu que, para os direitos individuais homogêneos, (de menor carga de coletividade) esse propósito, punitivo-educador, estaria alcançado quando o causador do dano tivesse que desembolsar quantia equivalente a um número razoável de liquidantes.
A tutela pelo equivalente pecuniário tem como objetivo tutelar o interesse público, não visa uma compensação financeira geral. Tem uma outra finalidade, que se coaduna com os valores constitucionais, ou seja, tem um caráter punitivo/educativo em relacão ao wrongdoer, além de de outros efeitos colaterais, como servir de exemplo e influenciar e orientar politicas públicas.
Portanto, a tutela pelo equivalente pecuniário no direito coletivo tem uma função punitiva e educativa e, não propriamente, de tutelar o direito coletivo violado, pelo menos não de forma direta. Essa condenação fluida tem por objetivo evitar a impunidade do responsável pela prática lesiva, com a punição do réu pelo dano globalmente causado, além do nítido caráter educativo e influenciador de políticas públicas.
Antonio Herman V. Benjamim afirma que a procedência da ação coletiva, nessas hipóteses, redundará numa situação de “ressarcibilidade indireta”, em que os sujeitos individualmente não são aquinhoados com o quantum debeatur, que vai para o fundo.
Ou seja, a tutela pelo equivalente pecuniário é uma técnica processual que no âmbito dos direitos coletivos, mais especificamente nas condenações fluidas do art. 100 do CDC, sofre uma alteração genética, transmudando seu objetivo original (indenizar indivíduos), para encampar um outro escopo, o de proteger a coletividade e evitar práticas lesivas ao interesse público. A tutela pelo equivalente pecuniário para os direitos coletivos é uma tutela indireta, já que a única tutela efetiva e direta é a tutela específica."
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