O Supremo Tribunal Federal (STF) fechou 2014 tendo julgado ao menos três discussões trabalhistas de impacto. São elas: a redução do período de ressarcimento do FGTS não recolhido pela empresa de 30 para cinco anos, a confirmação do direito a um intervalo de 15 minutos para as mulheres antes do início das horas extras e a concessão de aposentadoria especial ainda que o funcionário use equipamento de proteção individual (EPI).
A percepção de advogados trabalhistas é que a Corte superior tem julgado mais temas de relevância na área. "Os ministros do Supremo têm se debruçado mais sobre esses assuntos, por entender que alguns dispositivos trabalhistas estão em confronto com preceitos da Constituição, o que há alguns anos não era tão frequente", diz Daniel Domingues Chiode, do Lazzarini Moretti e Moraes Advogados. Além disso, na maioria das decisões, tem predominado uma visão mais empresarial, segundo a opinião da advogada Juliana Bracks, do Bracks & von Gyldenfeldt Advogados Associados.
O tema de maior repercussão, segundo os advogados, foi sem dúvida a redução do prazo de cobrança de diferenças não depositadas de FGTS. Até então, a jurisprudência do Supremo e do Tribunal Superior do Trabalho (TST) determinava que o trabalhador poderia pedir o pagamento dos últimos 30 anos do fundo não recolhido. Porém, por oito votos a dois, o plenário do STF alterou esse entendimento em um julgamento com repercussão geral.
Para os ministros, a previsão de 30 anos contraria o artigo 7º da Constituição, que fixa o prazo de cinco anos para a obtenção de créditos resultantes das relações de trabalho. A Constituição também traz o marco de dois anos para se entrar com a ação. A decisão, contudo, foi modulada e aplica-se o prazo de cinco anos apenas a partir do julgamento do Supremo.
O caso analisado envolvia uma ex-funcionária do Banco do Brasil, que requeria o FGTS não depositado entre maio de 2001 e dezembro de 2003. Por conta da modulação, ela terá o pedido inteiramente atendido.
Para Juliana, a decisão é polêmica, pois muitos trabalhadores contratados como pessoa jurídica, por exemplo, que após deixarem a empresa procuram a Justiça do Trabalho para ter o vínculo empregatício reconhecido, só terão direito a cinco anos de FGTS.
Além disso, segundo Juliana, o entendimento dos ministros de que o trabalhador celetista pode acompanhar o que foi depositado, e se os valores não baterem, pode reclamar com a empresa, "é uma ilusão". Isso porque o funcionário contratado tem um poder pequeno para questionar. Por outro lado, Juliana afirma que as empresas ficaram satisfeitas com o resultado. "O prazo de 30 anos é muito longo dentro da filosofia empresarial e dentro da redação literal da Constituição", diz.
Para os advogados, contudo, a modulação proposta ainda ficou confusa. Daniel Chiode acredita que a decisão deverá ser melhor esclarecida por meio de embargos de declaração.
Já o julgamento do STF que confirmou o direito a um intervalo de 15 minutos antes das horas extras para as mulheres, manteve o entendimento predominante no TST. O resultado final foi dado por cinco votos a dois. A maioria dos magistrados entendeu que o dispositivo não fere a igualdade entre os gêneros.
O recurso analisado pela Corte foi apresentado pela rede de supermercados Angeloni, de Santa Catarina. A empresa questionava a constitucionalidade do benefício, garantido somente às mulheres por meio do artigo 384 da CLT. No processo, a rede sustenta que a norma seria conflitante com o artigo 5º da Constituição Federal, segundo o qual "homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações".
Para o relator do caso no STF, ministro Dias Toffoli, o Legislativo já teve oportunidades de retirar da CLT a determinação de descanso às mulheres, mas nunca o fez. Em seus votos, tanto ele quanto a ministra Rosa Weber, que acompanhou o relator, afirmaram que nem todas as diferenciações feitas a homens e mulheres são discriminatórias.
Segundo a advogada Juliana Bracks, essa decisão abre a possibilidade para que trabalhadoras busquem na Justiça indenizações pelos 15 minutos não disponibilizados, o que até então não era muito pedido. Para o advogado Daniel Chiode, contudo, ainda há argumentação das empresas no sentido de que não conceder os 15 minutos à trabalhadora geraria apenas multa administrativa. Isso porque o artigo 384 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não deixa claro o pagamento de horas extras, caso a medida não seja concedida.
Entre os julgamentos mais relevantes do ano na área trabalhista, os ministros ainda entenderam que o uso de equipamento de proteção individual (EPI) pelo trabalhador não afasta o direito à aposentadoria especial, a não ser que o material elimine completamente o agente nocivo à saúde.
No caso analisado, que tratava de exposição ao ruído, os ministros entenderam que mesmo com o equipamento não haveria como isolar o empregado da exposição a barulho excessivo. O julgamento durou mais de três horas e teve repercussão geral reconhecida. Pelo menos 1.639 recursos semelhantes estavam parados nas instâncias inferiores, esperando o posicionamento da Corte superior.
O processo tratou do caso de um trabalhador que desenvolveu suas atividades entre 2002 e 2006 em ambiente com ruído superior a 90 decibéis. Na Justiça, o autor alegava que apesar de ter utilizado o EPI, teria direito à aposentadoria especial por ter atuado em local insalubre. A maioria dos ministros concordou que, em relação a trabalhadores que atuam em locais com ruídos acima dos limites legais de segurança, a simples declaração do empregador no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) de que o EPI é eficaz, não afasta a aposentadoria especial.
Para a advogada Juliana Bracks, o simples fato de a empresa pagar o adicional de insalubridade já seria prova suficiente para se conceder a aposentadoria especial. "Nenhuma empresa pagaria o adicional se não houvesse a comprovação de que há realmente um contato com os agentes nocivos."
Adriana Aguiar - De São Paulo
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