Para se compreender as normas jurídicas a fim de confirmar ou refutar a veracidade de uma determinada proposição jurídica afirmada por um juiz ou por um advogado no âmbito de um processo judicial, é necessário que primeiro se faça uma distinção entre as normas e que se conheça a causa essencial de cada uma dessas distinções. Primeiramente, posso dizer com profunda segurança, que as constituições, as leis e outros dispositivos normativos, trazem em seus textos normas que podem ser classificadas em regras jurídicas, princípios jurídicos e postulados jurídicos.
De antemão, destaco que as regras e princípios jurídicos são normas jurídicas e a distinção entre regras e princípios jurídicos são distinções feitas entre tipos distintos de normas jurídicas que tem diferentes características que possibilitam a sua distinção. Para fazer essa distinção, existem vários critérios. Vejamos:
a) critério de abstração: os princípios são normas de um grau de abstração relativamente mais elevado do que o grau de abstração das regras;
b) critério quanto à aplicabilidade: os princípios são conteúdos normativos extraídos de dispositivos que devem ser concretizados pelo aplicador. Isto é, os princípios são vagos e para serem aplicados precisam da atividade concretizante, ao passo que as regras, pelo fato de sua especificidade, podem ser aplicadas imediatamente ao caso concreto sem a necessidade de uma concretização.
Os princípios são fundamentais no sistema de fontes do direito, pois estruturam o sistema normativo e o próprio Estado (princípio do estado de direito, princípios gerais do Direito etc.), além disso, os princípios estão vinculados à ideia de justiça ou de direito, sendo que as regras são normas meramente funcionais, ou instrumentos de aplicação dos princípios. Destaca-se que, como já dito por Canotilho, os princípios também têm uma função nomogenética, pois são razões para a existência de regras as quais são criadas a fim de cumprir as exigências de um princípio. Dentre outras funções, os princípios desempenham uma função argumentativa que serve para fundamentar a aplicação de uma regra à um caso específico. Além disso, eles também têm a função de revelar outras normas que não foram explicitadas por nenhum dispositivo legislativo, mas que fazem parte do sistema jurídico, possibilitando a sua utilização sem mesmo a existência de um dispositivo de lei (princípio da insignificância, princípio da intervenção mínima, princípio do não enriquecimento sem causa etc.).
Qualitativamente os princípios também podem ser diferenciados das regras, tendo em vista que, segundo Alexy, aqueles determinam um mandamento de otimização. Isto é, podem ser aplicados em graus no momento de concretização de uma regra. Já as regras são normas que trazem uma exigência que não pode ser cumprida em graus, pois somente podem ser cumpridas ou descumpridas em sua totalidade.
Destaca-se que os princípios coexistem e podem ser aplicados ao mesmo caso concreto mesmo quando em conflito, já as regras, quando em conflito, se excluem, são antinômicas, não havendo a possibilidade de aplicação simultânea quando houver colisão. Nos casos de conflito entre princípios, é necessária a utilização de técnicas de argumentação a fim de que se faça uma ponderação racional e legítima entre eles, jamais podendo declarar por este motivo a invalidação de um deles. As regras também podem entrar em conflito, mas quando isto ocorrer é necessário utilizar-se dos critérios de resolução de antinomias: hierarquia (norma superior derroga norma inferior), especialidade (norma especial afasta a aplicação de norma geral), data de edição do dispositivo (norma posterior derroga norma anterior) etc., podendo, se for o caso, ser até declarada a invalidação de uma delas.
Os princípios jurídicos e as regras jurídicas são normas jurídicas que se diferenciam conforme algumas de suas características essenciais. No entanto, é defendido, principalmente pela jurisprudência alemã, que existem normas que não podem ser definidas como regras ou princípios. Estas normas seriam normas de segundo grau, também conhecidas como postulados, as quais definem métodos de aplicação das normas de primeiro grau.
Os postulados, apesar de serem normas, não se enquadram nem como princípios nem como regras, pois conforme definição sugerida por Ávila, eles são condições essenciais sem as quais nenhum objeto poderia ser conhecido. Na verdade, por mais que a terminologia comumente utilizada para denominar os postulados é o princípio jurídico, denomina-lo de princípio jurídico é um equivoco conceitual, embora erroneamente tolerado pela ciência jurídica e desconhecido por parte dos operadores do Direito.
Na ciência, os postulados são fatos indemonstráveis ou não demonstrados, cuja aceitação é condição para se estabelecer uma demonstração. Portanto, é uma proposição admitida como verdade, sem a necessidade de demonstração, mas cujo caráter não é aparente. Isto é, postulado é algo que simplesmente se assume como válido, não como um dogma, mas como uma das condições a vigorar para um dado modelo.
Os postulados jurídicos são os elementos formais de aplicação que definem métodos de aplicação de outras normas. Portanto, podem ser chamados de supernormas. Os postulados jurídicos não podem ser de forma alguma confundidos com os princípios jurídicos (embora seja comum essa confusão), pois não podem ser cumpridos de modo gradual, como se fosse um mandamento de otimização assim como sugerido por Alexy, não instituem qualquer tipo de procedimento, não podem entrar em conflito com outras regras jurídicas ou princípios jurídicos, não são estabelecidos como um dever-ser ideal e também não podem ser sopesados ou ponderados.
Os postulados também não podem ser classificados como regras jurídicas, pois não são normas imediatamente descritivas, na medida em que estabelecem obrigações, permissões ou restrições mediante a descrição da conduta a ser cumprida.
Importante destacar que os princípios e as regras podem ser dirigidos tanto ao poder público quanto aos sujeitos de direito, entretanto, os postulados são dirigidos, quase que exclusivamente, ao interprete das normas jurídicas.
Como já dito por Ávila, os postulados normativos são normas imediatamente metódicas, que estruturam a interpretação e aplicação de princípios e regras mediante a exigência, mais ou menos específica, de relações entre elementos com base em alguns critérios. Ávila corretamente afirmou que, no âmbito da ciência jurídica, existem os postulados hermenêuticos e os postulados aplicativos. Conforme o jurista, os postulados hermenêuticos são àqueles destinados a compreensão das normas jurídicas, ou seja, são proposições utilizadas a fim de criar a possibilidade de se obter uma correta compreensão do ordenamento jurídico. Entre eles posso destacar o:
a) postulado da unidade, que indica que o interprete, ao conhecer o ordenamento jurídico, deve levá-lo em consideração como um sistema em que deve a parte ao ser interpretada, ser relacionada ao todo;
b) postulado da coerência, o qual determina que deve as normas serem relacionadas umas as outras, na medida em que forem dependentes; e o
c) postulado da hierarquia, o qual determina que ao interpretar o ordenamento jurídico, o interprete deve observar a existente estrutura escalonada e hierárquica das normas jurídicas.
Já os postulados jurídicos ditos aplicativos são normas que definem métodos ou critérios de aplicação de outras normas. Portanto, estes postulados normativos são denominados como metanormas e classificados, conforme já dito, como normas de segundo grau.
No momento de se interpretar a norma jurídica, devem ser levados em consideração dentre outros, os seguintes postulados jurídicos de aplicação: ponderação, concordância prática, proibição de excessos, igualdade, razoabilidade, proporcionalidade, legitimidade etc..
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